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Declaração do Bloco de Esquerda em Oeiras

A República reforça-se com a Democracia na cidade eco-socialista mas, os contornos burgueses do “desenvolvimento” democrático, como por exemplo, a ausência de justiça social e territorial no governo da cidade e da região, atrasam-na e acentuam as desigualdades e as assimetrias da vida das populações e da economia desses territórios.

 

No encontro de balanços económicos e sociais, fora do parlamento, de cada uma das regiões e cidades do país, como Oeiras, poderemos evidenciar o contraste entre o que seriam as opções de desenvolvimento sustentável duma sociedade com justiça social, territorial e ambiental e aquela que é controlada por leis e regulamentos que têm permitido projectos capitalistas especulativos. Projectos que nos trazem elevados custos sociais directos e indirectos e a que não é alheia a irracionalidade da exploração dos recursos materiais e humanos, além dos custos provocados pelos impactes, por exemplo, duma difusão urbana com consequente aumento das externalidades negativas nos transportes, na saúde, no ambiente e na energia.

 

Fizeram crer que esses impactes deveriam ser geridos através das orientações liberais e neo-liberais que consagraram a privatização da República: - os serviços públicos dos transportes, da saúde, do ambiente e da energia e que passaram a fazer parte do léxico da economia privada contra a economia pública. Depressa se foi consolidando toda uma construção legislativa a consagrar o direito privado sobre o direito público, deixando para trás toda a construção duma sustentabilidade a basear em códigos civis, de urbanismo, de transportes, de racionalização do ar e da energia, como já era recomendado pelo relatório Brundtland em 1987 e mais tarde consagrado no Protocolo de Quioto e Agenda Local XXI, em que se exigia o cumprimento do princípio de precaução e a justiça social, territorial e ambiental.

 

Em Portugal, os governos e os bancos empreenderam essas políticas e ampliaram os usos e costumes na privatização das “utilities” da economia pública e social. Perdeu a República e perdeu a Democracia. Dentro deste espectro político, não só verificável ao nível europeu, nem todos os Estados, e por demais, as Repúblicas, se deixaram dominar exclusivamente por essa lógica especulativa, ou seja, existem algumas “boas práticas” de enquadramento ecológico, desenvolvidas em cidades e regiões de países capitalistas avançados, em transição para uma sociedade socialista.

 

Seja pelo elevado nível político da democracia participativa ou de grandes movimentos sociais ecológicos, seja pelo próprio estádio de desenvolvimento das suas forças produtivas, nestes países fizeram-se consagrar princípios e objectivos de ecologia urbana de desenvolvimento sustentável e que aplicaram as raízes da Democracia Participativa nos seus programas de Economia Verde (ex: Grenelle Environement). Ao romper com o modo de produção capitalista, estes programas poderão ter, na sua génese, as raízes da democracia socialista uma vez que o modo de produção seria debatido, planeado e organizado pela sociedade em geral.

 

Neste contexto, a ampliação da aplicação de conceitos de cidadania, ecologia urbana, desenvolvimento sustentável e democracia participativa desses países só está a confirmar a teoria do desenvolvimento desigual e combinado e coloca no centro do debate da governação urbana, a questão da cidade que queremos no plano da ecologia urbana e de desenvolvimento sustentável, sabendo que a ideologia dominante está já a fazer a sua incursão “inteligente” nestes domínios, aos quais devemos saber responder.

 

Portanto, o primeiro cuidado/desafio que se coloca hoje em dia é como se deve combater a instrumentalização política das orientações liberais e neo-liberais sobre a ecologia urbana e o desenvolvimento sustentável, como já o pretende fazer o Governo PSD/CDS, ou ainda, como fazer a governação urbana de esquerda com PS, PC e movimentos autónomos de cidadãos pelas cidades eco-socialistas e de rotura com o sistema capitalista;e o segundo desafio é o combate por uma descentralização institucional (local e regional), nas atribuições de competências, por exemplo, às Comunidades Inter Municipais (CIM), como forma de aumentar a Democracia da República, sendo certo que a discussão desta descentralização institucional só pode visar a justiça social, territorial, ambiental e económica.

 

Trata-se, portanto, de fazer primeiro, o programa de governação eco-socialista da cidade e/ou da região e depois, construirmos a proposta institucional da administração do território.

 

Ora, neste encontro de perspectivas sobre programa de governo local, devemos antecipar o nosso esforço político na defesa da ecologia urbana e desenvolvimento sustentável, e por consequência, na Democracia que defenda a República das cidades eco-socialistas com justiça social, territorial e ambiental.

 

A - Defendemos a sustentabilidade do eco-socialismo nas cidades e regiões porque é uma alternativa que combate as políticas de austeridade e a irracionalidade do capitalismo.

 

Falar de República das cidades eco-socialistas (e das regiões) é ir muito além do Parlamento, é clarificar princípios, objectivos e metas contra o desperdício dos recursos naturais, materiais e humanos causados por políticas e agentes da especulação e de privatização dos serviços públicos; ao mesmo tempo em que o ordenamento do território, das infraestruturas e equipamentos colectivos são planeados com maior integração e coerência de acordo com as necessidades sociais, com justiça social e territorial em que os critérios de ecologia urbana são aplicados no desenvolvimento sustentável e em que o controlo democrático sobre o financiamento de projectos de cidade eco-socialista, combate as políticas de austeridade, cria mais emprego e aumenta a riqueza dessas cidades e regiões. Por exemplo, estudos recentes demonstram que o investimento no transporte público não só gera actividade económica e aumenta a produtividade da economia urbana, como também, gera um valor entre 3 a 4 vezes o investimento inicial[1] e diminui todo um conjunto de externalidades nocivas à sociedade.

 

Neste contexto, a concretização de programa estratégico de sustentabilidade para cidade e região não trata só de racionalizar a economia, como pretendem algumas correntes verdes – ver nota da UITP - mas, antes deve basear-se numa excelência de qualidade de vida e do ambiente urbano, em que a reabilitação urbana se articule, por exemplo, com a acessibilidade sustentável, com projectos de Transporte Colectivo em Sítio Próprio (TCSP) e vida sustentável em bairros ecológicos promovendo a integração coerente com a justiça social, territorial e ambiental em planos sociais e económicos de pleno emprego.

 

Esta estratégia vai para além das leis económicas e financeiras baseadas em planos de austeridade capitalista e irá, também, combater os Planos de Urbanização e os Planos Directores Municipais (e os planos especulativos de infraestruturas e equipamentos) actuais pois, terá de corrigir o desperdício gerado pela difusão urbana entretanto acentuada nos últimos 30 anos quer ao nível dos balanços energéticos quer ao nível das externalidades negativas com impacto no aumento dos custos sociais, cuja responsabilidade também tem perpassado pelas governações urbanas de esquerda (PS e PCP).

 

É também uma estratégia e programa que dimensionam a qualidade da cidade orientando-a para a escala humana de proximidade, de densidade e diversidade que permita coerentemente uma completa integração social, territorial e ambiental, por exemplo, promova a mobilidade sustentável, ou seja, uma maior utilização dos modos alternativos ao automóvel, como os modos suaves e o Transporte Colectivo (TC).

 

Ora, este programa autárquico é o mesmo que permite planear e organizar a(s) cidade(s) e a(s) região(ões) com prioridade aos modos alternativos, às energias renováveis e minimizar as externalidades negativas e os impactos dos seus custos sociais. É também um programa que permite sustentar a ecologia urbana ao nível do município e em que os diversos centros urbanos ou cidades aí existentes saibam articular os bairros nas relações de solidariedade e justiça social e territorial, de qualidade das escolas e centros de saúde, da diversidade de etnias e culturas, de reforço do desporto e do lazer.

 

B - É possível realizar esta rotura estratégica com este programa de ecologia urbana e desenvolvimento sustentável contra a lógica do modo de produção e de consumo capitalista.

 

Em geral, os programas de habitação, de transportes, de equipamentos colectivos de ensino e saúde aplicados pelos diversos governos de cidade nunca foram aplicados segundo critérios de sustentabilidade e muito menos de ecologia urbana – Oeiras foi um exemplo disso. Promoveu-se a dispersão urbana, com os Planos de Urbanização adaptados à iniciativa privada, ao mesmo tempo que se acentuam a “ghetização” e a gentrificação e se abandonava a integração social e económica. Não foram realizadas práticas de boa vizinhança e de proximidade que se exigia terem sido realizadas através de políticas de diversidade, densidade e desenho (3 D’s) e que ao mesmo tempo se consagrasse um concelho baseado em eco-bairros.

 

A agravar esta situação, sempre que a administração central intervinha nos projectos de grandes infra-estruturas e equipamentos, como os pacotes de acessibilidade em redes rodoviárias ou em redes de saneamento ou até de equipamento social (escolas e centros de saúde, desporto ou lazer), nunca foram realizadas tendo em conta a análise custo-benefício social ou quando o foram, foi sempre numa lógica de ocupação e usos do solo especulativos e, portanto, sem qualquer Esquema de Coerência Territorial e sem qualquer Conta Pública, como por exemplo, do Sistema de Deslocações que permitisse sustentar a decisão.

 

Em todos estes anos, a consulta pública foi sempre instrumentalizada, limitada e manipulada, vejam-se os exemplos recentes da CRIL, ou da localização de hospitais como o de Cascais e Loures, para não falar da Amadora, em que a acessibilidade se faz por modo rodoviário e transporte individual, ou como já se pretende fazer com a localização do Terminal da Trafaria.

No sector dos transportes, só da AML, terão sido gastos mais de 75 mil milhões de euros nos últimos 35 anos, entre construções, ampliações, renovações e remodelações das infra-estruturas e equipamentos colectivos terrestres, desde o marítimo, aéreo, ferroviário e rodoviário. Noutros sectores, como o da saúde e do ensino, haverá com certeza outros números. Mas, sabendo ao estado de dependência energética e efeitos negativos do sistema de transportes, de redução de serviços e o respectivo encarecimento das políticas neo-liberias, trata-se, agora de romper com esta lógica e apresentar soluções alternativas à privatização destes serviços em três domínios que afectam as necessidades individuais e colectivas das pessoas e das empresas. Como se faz o programa, o planeamento e a gestão da coisa pública?

 

Em primeiro lugar, suspender o programa de austeridade da TROIKA e suspender o PET que advoga a suspensão do investimento e financiamento público do sistema de transportes. Noutros sectores, provavelmente o mesmo. No caso dos transportes, há a oportunidade de cerca de 1/3 do QCEN 2014-2020 poder financiar e ser utilizado em projectos de TCSP para se promover a cidade ou a região ecológica, tornando-a menos dependente energeticamente e com menos custos sociais. Neste programa, a atender as conclusões dum estudo feito para a APTA[2], por cada bilião de euro aplicado, espera-se criar em média 36 mil postos de trabalho e a riqueza poder aumentar a prazo em cerca de 3,5 biliões de euro. Ou seja, os investimentos públicos serão orientados para o pleno emprego e ampliação de emprego qualificado.

 

Em segundo lugar, aplicar um programa de ordenamento dos usos do solo e dos transportes e tendo como objectivo duplicar o uso dos modos alternativos, como por exemplo, duplicar a procura actual do TP, corrigir-se-ão os níveis de serviço de oferta, melhorando a regularidade, frequência, segurança e conforto, aplicando o princípio da tarifa única a um PTU (Perímetro de Transporte Urbano) fazendo uma integração e simplificação tarifária, diminuindo os preços e colocar regras de subsidiação à exploração das várias empresas com base em contratos de OSP planeados e organizados pelas autarquias nas autoridades de transporte. Será elaborada uma Conta Pública do Sistema de Deslocações em Planos de Deslocações Urbanas (PDU) Sustentáveis e as populações serão chamadas a consulta pública para se tomar decisões que respeitem ao TP (Transporte Público), uma vez que se propõe que a cidade ou município sejam orientados para o uso dos modos alternativos, modos suaves e TP de qualidade, diminuindo-se as despesas com o TI.

 

Todos estes PDU deverão permitir elaborar o Esquema de Coerência Territorial com as infraestruturas e equipamentos colectivos planeados e organizados com critérios de rendibilidade social, rompendo-se com a prática actual de inflação e da pouca qualidade dos mesmos, uma vez que só têm sido orientados para a consecução de PPPs e não têm obedecido a critérios de desenvolvimento e financiamento sustentável.

 

Em terceiro lugar, com esta mudança de orientações estratégicas na aplicação de dinheiros públicos e de cidades viradas para o eco-socialismo, as governações de esquerda terão de ser assumidas de modo que a gestão da coisa pública tenha em consideração a defesa dos princípios e objectivos do Estado Social, justiça social, territorial e ambiental. Estes governos devem, por isso, acentuar a sua actuação nos Fóruns Sociais de participação cidadã na construção da cidade eco-socialista. Serão estes Fóruns Sociais que ao nível dum concelho, agregando e reunindo anualmente os movimentos de cidadãos, partidos, sindicatos, ONG, e outros movimentos associativos, poderão romper com a actual instrumentalização por parte das instituições e a falta de participação nas deliberações que a comunidade local deve ter.

 

Os recursos naturais são hoje desequilibradamente e irracionalmente consumidos face à lógica do modo de produção capitalista. Os programas de exploração desses recursos são conduzidos com base na inflação de preços, tarifas e juros, garantindo as margens às empresas e ao sistema bancário que os financia. O exemplo do consumo de combustível fóssil é dos mais ilustrativos: em 2007, cerca de 10, 1 biliões de viagens realizadas em TP pouparam nos EUA um consumo de 1,4 biliões de galões de gasolina, o equivalente ao abastecimento em cada 11 dias de um petroleiro supertanque[3]. Por outro lado, a biodiversidade do planeta é colocada em causa e as populações são concentradas em cidades, cuja economia é inflacionada face aos enormes recursos materiais e humanos requeridos.

 

É neste contexto que toda a programação eco-socialista deve denunciar esta lógica e contrapor um conjunto de alternativas que se baseiem na ecologia urbana e desenvolvimento sustentável. É neste contexto que a Convergência de Esquerda é desejável e possível com base num programa de Objectivos e Contas Públicas que evidenciem uma Governação apostada na completa justiça social, territorial e ambiental.

 

C - A reforma institucional e administrativa do território (urbano e regional) e o desafio da descentralização e da democracia da República, é realizada sob os princípios e objectivos da ecologia urbana e do desenvolvimento sustentável ao contrário das propostas neo-liberais.

 

O modelo neo-liberal de reforma administrativa do PSD/CDS prescreve uma diminuição do número global das freguesias e dos municípios, porque há que reduzir custos com os encargos administrativos e políticos, e propõe assim que nas estruturas intermunicipais haja mais competências. Para alguns, dir-se-á que se trata de diminuir a “democracia” e para outros, a “República” sai diminuída. Nem num caso, nem noutro, os conceitos de República e da democracia se definem pelo número de municípios e de freguesias, uma vez que a representatividade, das necessidades sociais e económicas das populações, não se mede no contorno duma assembleia municipal e/ou de freguesia. A democracia participativa será mais que uma alternativa à representatividade, ela contribuirá para a defesa do Estado Social da República, ajudando a construção social do mesmo. O Fórum Social é parte dessa agenda local.

 

Portanto, aquela gestão neo-liberal da estrutura administrativa do território não é inócua; acompanha tão só, a ideologia da Troika de diminuição dos serviços públicos de proximidade e da privatização dos mesmos ou concessionados pelas autarquias ao nível das CIM[4] ou comunidades urbanas, enquadrada na lei fiscal do OE2013. Porém, ao tentar atribuir mais competências às CIM, não deixa de colocar em debate a questão da descentralização política e, logo, pronunciar outro enquadramento teórico acerca da articulação das necessidades das populações da cidade e da região, o que nos traz novamente ao programa eco-socialista.

 

Para além da batalha política imediata de denúncia e derrota da ideologia neo-liberal, convém, no entanto, relembrar que durante os últimos 35 anos de administração/intervenção nos territórios urbanos, dum modo geral, foi-se acentuando uma completa subversão do que deveria ter sido um programa de desenvolvimento sustentável, tal como era recomendado no relatório Bruntdland em 1987 à comissão do ambiente da ONU onde se defendia o princípio da precaução, ou ainda o protocolo de Quioto assinado em 1992 e que Portugal subscreveu.

 

De facto, nestes 35 anos foram produzidas demasiadas infraestruturas e equipamentos sem uma avaliação coerente com a qualidade e justiça territorial e social. Atrás da “inflação urbanística” evidenciada na dispersão urbana dos territórios, foi-se consumindo espaço, tempo e energia em elevados volumes de deslocações motorizadas como nunca antes, em que os meios aplicados geraram mais desperdício e custos, do que benefícios.

 

E nestes 35 anos, a Governação urbana por partidos de Esquerda (PS e PCP) não se distinguiu do modelo de favorecimento privado, iniciado nos anos 80 (cúmplice da escola neo-liberal quando Thatcher lançava a privatização dos serviços sociais – as “utilities” – e/ou desregulava o crédito na venda/compra das casas abandonando as políticas sociais de habitação…). Pelo contrário, como já se referiu, coincidiu com o início na Europa, de todo um processo acentuado de desregulação da economia urbana levado até aos dias de hoje, com todos os efeitos negativos acumulados e que acabaram por “explodir” na “bolha” especulativa em 2007, após algumas recessões pelo meio.

 

Neste contexto, é preciso que a leitura acerca da reforma administrativa troikana, enunciada e aplicada por força de lei fiscal orçamental, seja denunciada e derrotada. Mas, também, é preciso romper com essa administração e gestão da ocupação e usos do solo e entender que a descentralização é necessária, se for compatível com a maior justiça social, territorial e ambiental, e realizada com coerência e integração do território quer urbano quer ao nível da região em que a cidade se insere. Isto significa, de facto, uma maior articulação entre municípios e, por isso, mais democracia participativa, mais fóruns sociais, mais consultas públicas, mais cidadania, o que invariavelmente vai contra a actual ideologia dominante.

 

D - Como mudar então este paradigma do PSD/CDS e como entrar rapidamente no caminho da ecologia e sustentabilidade urbana que devolva a qualidade de vida e de trabalho às pessoas e às empresas? Cumprir Protocolo de Quioto e lutar pela defesa do Estado Social.

 

Começar uma política programática coerente e consequente com a ecologia e sustentabilidade urbana, torna-se por isto, o denominador comum da nossa intervenção política e institucional já para 2013 e nas próximas eleições autárquicas.

 

Muitas cidades portuguesas comprometem-se em Protocolos internacionais em defesa da qualidade do ambiente urbano, como por exemplo o Pacto dos Autarcas (Convenant of Mayors), outras candidatam-se a fundos estruturais e outras ainda compreendem a sua actividade na participação em projectos europeus. O próximo QCEN 2014-2020 vai possibilitar o reforço do Investimento Público em 21,5 mil milhões de € e mais uma vez a discussão pública e a cidadania ficam omissos, enquanto as administrações dos municípios já se preparam para essas candidaturas sem qualquer estratégia. Ora, há que mudar o paradigma seguido até aqui e também há aqui uma oportunidade de afirmar como é que a Governação Urbana em defesa do Eco-Socialismo entende o Investimento Público seja no reforço tecnológico e criação de emprego qualificado seja no desenvolvimento sustentável.

 

Neste sentido, o BE de Oeiras apela a um Programa de Ecologia e Sustentabilidade Urbana da AML a ser lançado ainda em 2013, para ser elaborado com a urgência da participação cidadã, organizações sociais e políticas, em Fóruns Sociais, dinamizando-o para construção de cidades eco-socialistas nos seguintes objectivos, metas e eixos de intervenção com a seguinte agenda:

 

Até finais de2013, aumentar a eficiência institucional e legislativa preparando as seguintes propostas:

 

- Anulação de parte da dívidae reestruturação dos prazos e juros de pagamento, através da necessidade de financiamento ao investimento público de projectos consentâneos com o desenvolvimento sustentável da economia urbana;

- Afirmação do princípio de descentralizaçãoe responsabilização em economia local/regional, pela consolidação da eleição directa da Comunidade Urbana ou CIM por regiões, já em 2014, com competências no ordenamento, planeamento e gestão dos sistemas sociais e territoriais de habitação; transportes urbanos e regionais; educação; saúde e desporto; e no ordenamento e planeamento fiscal de consecução dos Planos Estratégicos e Operacionais que respeitem os princípios de desenvolvimento sustentável baseados nos critérios e objectivos da ecologia urbana;

- Elaboração deprograma social de pleno emprego com base na escala móvel de horário (30 horas) e de salários (mín.1000 €) nos serviços públicos de transporte, saúde e educação, da energia e das águas; simplificação de carreiras profissionais; elaboração de CCTV;

- Criação, em 2014, dum Instituto de Urbanismo de apoio ao Estado Social e de Agências de Urbanismo às Comunidades Urbanas e Municípios para revisão e/ou elaboração imediata dos Planos de Urbanização e PDM e apoio aos PDU;

- Criaçãodas AOTU e mecanismos de contratação e financiamento do transporte público urbano pelos municípios, promovendo o Reforço do Sistema de Transporte Público aumentando a sua cobertura territorial e temporal, os serviços multimodais e diminuindo a dependência do automóvel através de políticas tarifárias e fiscais;

- Regulamentaçãodas Leis Base do Ordenamento do Território e dos Transportes, passando pela revisão da lei do arrendamento habitacional, da lei de criação dos eco - bairros, da lei do financiamento dos transportes e, particularmente, do transporte público de passageiros com recurso a fundos estruturais europeus e/ou do BEI;

- Proposta duma Lei da Racionalização do Ar e da Energiaque defenda a elaboração e consolidação dos PDU pelas AOTU com metas ambientais e energéticas, de repartição modal favorável à prioridade do uso do TP urbano;

- Proposta de lei de reforço da Escola Pública, e o fim do financiamento das GPS do ensino privado;

- Proposta de lei de reforço do SNS, e o fim do financiamento às GPS de saúde privada;

- Proposta de lei do ordenamento fiscal descentralizado, pelo reforço dos serviços sociais de proximidade e consequente estratégia de reocupação do território urbano, condensado no PTU.

 

Até finais de 2014, aumentar a capacidade de ordenamento e regulação através de:

 

- Revisão dos PU, PDM e PROT em Fóruns Sociais de acordo com as orientações dos PDU que promovem a mobilidade e acessibilidade sustentável de âmbito local/concelhio ou regional;

- Reabilitação Urbanapromovendo os eco-bairros e articulando políticas 3Ds (Diversidade, Densidade e Design) com os projectos de Transporte Colectivo em Sítio Próprio (TCSP) e aumento do uso dos modos suaves, diminuindo a dependência dos combustíveis fósseis;

- Elaboração do Esquema de Coerência e Justiça Territorial e Sociale do Contrato Plano Estado-Região para a consecução do PROT e respectivo orçamento e financiamento através, por exemplo, do QCEN;

- Consolidação dasentidades públicas de regulação regional e comunitária baseada nos respectivos instrumentos de gestão e planos de actividade;

- Reestruturação da dívida,dos prazos e juros com a administração central do Estado;

 

Até finais de 2015, repor os mecanismos sociais, económicos e fiscais do Estado Social através de:

 

- Elaboração de programa estratégico, económico e social de desenvolvimento sustentável através de políticas de crédito público (e privado) controladas de acordo com as necessidades sociais e económicas colectivas e através do apoio a programas de investigação aplicada que articulem Universidade, Autarquia e Empresa, seja no domínio dos transportes, da biotecnologia e biomédicas, da indústria de energia renováveis, etc., mas, sempre com base no desempenho para a economia local/regional;

 

- Elaboração de programa económico de pleno emprego com base na prioridade aos projectos de reabilitação urbana dentro das áreas dos PTU (Perímetro de Transporte Urbano) articulada com o reforço dos serviços públicos, nomeadamente dos transportes, da educação e da saúde e sua articulação com pequenas e médias empresas no apoio a diferentes sectores quer na vertente de investigação aplicada, quer na vertente de desenvolvimento de indústria de construção e desenvolvimento tecnológico de sistemas de informação, comunicação, transporte e comércio.

 

Esta é uma agenda não acabada, haverá com certeza cidadãos doutros sectores de intervenção local que podem colocar propostas mais concretas de solução e/ou de alternativa/rotura com as práticas e os modelos actuais neo-liberais. Pegar num sector é muito mais que um exercício de crítica, de avaliação e de apresentação de propostas alternativas. No sector do ordenamento do território, urbanismo e transportes há diversos níveis daquele exercício e afinar um programa que vá contra o actual PET (Plano Estratégico de Transportes), exige compreender como funciona todo o sector dos transportes nas suas diferentes áreas, níveis de intervenção com os diversos actores.

 

Uma coisa é certa, o que se propõe são apenas eixos que vão contra o programa PSD/CDS neo-liberal de desregulação, de privatização e de concessões, portanto, planeadas e deliberadas e com objectivos ideológicos que se está a fazer nos diferentes sectores (aéreo, ferroviário, marítimo e rodoviário). Não se pode ficar na mão do capital financeiro e muito menos de inviabilizar projectos que hoje são reprovados sem sequer estudados sob o argumento de que o dinheiro é caro (claro, se for com as taxas de juro destes bancos).

 

Esta é também uma Carta anti neo-liberal!!! Estas são algumas pistas desta Carta anti neo-liberal, do que se pode discutir e reforçar o que deve ser a Governação Urbana de Esquerda, ou seja, também servirá para se elaborar um Programa de Governo de Esquerda.

 

Mas, esta é a tarefa central que o BE tem de cumprir abrindo este debate à sociedade através do trabalho local assente nos Fóruns Sociais e de preparação dum novo Congresso Democrático das Alternativas à ideologia neo-liberal e ao capitalismo. Por isso é que se defende um trabalho local que ultrapassa as questões meramente autárquicas, e o Fórum Social é o apelo imediato à mobilização da sociedade pelo eco-socialismo.

 

[1] As cidades concentram 60 a 70% da população mundial e 80% da produção económica e em que uma mobilidade eficiente cria oportunidades económicas e integração social, apoia as empresas e facilita o acesso aos serviços. Das 11,5 biliões de deslocações diárias motorizadas previstas para 2025 nas cidades em todo o mundo, cerca de 2,9 biliões serão realizadas nos países da OCDE com um acréscimo de 12% em relação a 2005. A maior parte das deslocações diárias serão motorizadas prevendo-se um acréscimo de externalidades negativas, como o aumento de 30% dos GEE não só arriscando o desempenho ambiental como também o crescimento económico a um impasse…daí que a aposta no TP mitiga essas emissões; cerca de 3.5 menos de GEE por passageiro.km transportado por automóvel, ou seja, se houver o dobro das deslocações em 2025 realizadas em TP as cidades também estarão melhor colocadas para respeitar os compromissos internacionais sobre alterações climáticas. Em termos de consumo de energia de transporte urbano, se a quota de TP dobrar até 2025, haverá uma maior estabilização uma vez que se absorveria a aior parte das deslocações previstas dessa mobilidade urbana. Fonte: “Green growth with public transport”, UITP 2012.

[2]American Public Transport Association

[3]Ver em http://reconnectingamerica.org/resource-center/books-and-reports/2009/jumpstarting-the-transit-space-race/

[4]Actualmente são órgãos não eleitos por sufrágio directo.